A pandemia de coronavírus não está somente a prejudicar a saúde da população, a economia mundial ou a mobilidade das pessoas. Diante do cenário de quarentena ou isolamento voluntário em vários países, o temido COVID-19 está também a inviabilizar o convívio social. No município de Acquarossa, na região do Cantão de Ticino, no sul da Suíça, o perigo de infeção por conta desse vírus provocou o adiamento da tradicional “Festa del Cuore”, ou “Festa do Coração” (em tradução livre da língua italiana), que aconteceria no dia 29 de março. O evento, que acontece ininterruptamente há 20 anos, e que pretende ajudar na luta contra o cancro, é promovido pela portuguesa Maria José Guia Pereira Giardelli, que está emigrada na Suíça há 39 anos. A expectativa agora é realizar o encontro em setembro.
“Tivemos que adiar a festa que já estava organizada. O governo de Ticino decidiu implementar restrições severas para limitar a infeção de Covid-19 e evitar o colapso do sistema de saúde. Em locais públicos, somos exortados a usar máscaras e luvas, a desinfetar as mãos e a manter uma distância de, pelo menos, um metro das outras pessoas. Uma das restrições, anunciada no dia 13 de março, proibiu manifestações com mais de 100 pessoas. Até as missas estão proibidas. Na nossa festa, costumam participar mais de 100 pessoas e, por esse motivo, fomos obrigados a adiar o certame”, comentou Maria José Giardelli, que sublinhou que os rendimentos da festa “são doados para a Liga Ticinese contra o Cancro e para a Associazione Triangolo, que dá assistência aos pacientes oncológicos”.
Para esta emigrante, o adiamento da realização da festa é a decisão mais sensata a se tomar neste momento.
“Ter de cancelar tudo a menos de um mês da data da festa não foi uma decisão fácil, mas foi necessária. Percebo perfeitamente as motivações do governo Ticino em aplicar essas restrições. Vamos fazer o possível para não infetar a população com o Covid-19. Sem todas estas restrições, o contágio seria muito mais rápido e os hospitais não teriam camas suficientes em Terapia Intensiva”, ajuizou Giardelli.
Raízes e preocupação
Maria José Guia Pereira Giardelli, conhecida também como “Josi Giardelli ou Zezinha”, é natural de Travanca, no concelho de Armamar, distrito de Viseu. Está emigrada na Suíça desde 1981, onde trabalha no ramo da hotelaria. Em 1985, casou-se com Giorgio Giardelli, com quem teve dois filhos.
“Estou a rezar para que a minha família em Portugal e no Brasil tome os devidos cuidados e se proteja”, disse.
Ajudar o próximo
A iniciativa de promover a “Festa do Coração” nasceu nos anos 2000 depois que “Josi” enfrentou problemas graves de saúde. Em retribuição por ter vencido a doença, decidiu compartilhar esperança com a população local e com os amigos.
“Em 1996, tive um cancro no seio, em estágio muito avançado, mas, graças a Deus, tive a sorte de me curar. Contei com o apoio do meu marido e encontrei pessoas espetaculares que me ajudaram imensamente, como a Associazione Triangolo e o médico oncológico suíço que me ajudou, Dr. Marco Varini. Eu tinha já dois filhos de 3 e 9 anos e não foi nada fácil. Assim, nasceu o meu desejo de ajudar aqueles que estão a passar pela mesma situação que passei para tentar combater a doença”, recordou Giardelli.
O evento, que acontece anualmente, decorre nas instalações do Ristorante Pizzeria Rubino, do qual são proprietários Josi e o marido, desde 1976. Localizado em Acquarossa, o estabelcimento recebe, durante a festividade, cerca 150 pessoas. O público, que colabora com as despesas da celebração, é composto principalmente por moradores da região de Ticino.
“Essa é uma festa muito conhecida no Cantão de Ticino. Nao poderia acontecer sem a ajuda de todas as pessoas que trabalham por beneficência: o grupo do Coração. Enfeitamos as mesas com flores e oferecemos pequenas prendas aos participantes. Todos colaboram com muito amor. Para a edição deste ano, que seria a vigésima, um coral e uma orquestra iriam participar. Teríamos a presença de profissionais de saúde e da responsável pela Liga Ticinese contra o Cancro, senhora Alba Masullo. Vamos tentar adiar tudo para setembro”, informou Giardelli.
Situação agravada na fronteira
O primeiro caso do vírus Codiv-19 na Suíça foi detetado no final de fevereiro exatamente no Cantão de Ticino, junto à fronteira com a Itália, o país mais atingido na Europa.
Até 15 de março, a Suíça tinha mais de 1.500 casos confirmados de coronavírus. Houve 14 mortes. A maioria das vítimas fazia parte do grupo de risco e tinha mais de 70 anos.
A situação no País segue em permanente atenção. Foi determinado pelas autoridades do País, além de outras medidas anteriores, que todas as empresas de restauração, lojas (excluindo as que vendem artigos básicos, como alimentos), cabeleireiros, esteticistas, etc. devem fechar as portas ao público. Apenas mercearias e farmácias permanecerão abertas, assim como serviços bancários e postais, quiosques e estações de serviço.
As autoridades já haviam decidido pelo fechamento de todas as escolas, proibiram a organização de quase todos os eventos e lançaram um pacote de ajuda económica de 10 mil milhões de francos.
Para tentar travar o aumento do número de casos de infeção no sul do País, a entrada na Suíça, a partir da Itália, apenas será autorizada “aos cidadãos suíços, às pessoas que tenham autorização de residência na Suíça e às que viajem para a Suíça por motivos profissionais”. O trânsito e transporte de mercadorias permanecem autorizados.