Vivemos numa era em que o tempo deixou de ser apenas uma linha reta. A urgência do presente, simbolizada pelo deus grego Kairós, redefine o modo como lidamos com as organizações e, principalmente, com as pessoas que as compõem. Na mitologia, Kairós é o deus do tempo oportuno — aquele que passa rapidamente, oferecendo uma oportunidade única que, se não for aproveitada, desaparece para sempre. E é exatamente assim que o presente nos convoca: com velocidade, com intensidade e sem possibilidade de retorno.
Enquanto o velho tempo linear de Kronos — aquele que mede os minutos e os anos — ainda dita nossos calendários corporativos, é o tempo de Kairós que dita as transformações mais profundas. As mudanças no mundo do trabalho não são projeções para o futuro: elas já estão em curso. E poucas áreas têm sido tão exigidas a evoluir quanto a de Recursos Humanos.
O paradigma superado da retenção
Durante décadas, a expressão “reter talentos” foi repetida como mantra nos corredores das empresas. Reter significava segurar, conservar, manter sob controle. Mas essa lógica, herdada do século XX, não encontra mais eco nas necessidades e valores das novas gerações de profissionais.
A realidade atual mostra que os talentos não querem ser retidos. Eles querem escolher ficar. E essa escolha está diretamente ligada a fatores que ultrapassam salário e estabilidade: propósito, liberdade, reconhecimento, ambientes inovadores e relações de trabalho saudáveis. Em outras palavras, o profissional do século XXI não quer estar em uma empresa que o tolhe, mas em uma que o inspira.
Do controle à confiança
A ascensão das tecnologias, a inteligência artificial e a Internet das Coisas remodelaram não só o ambiente físico de trabalho, mas também as relações interpessoais e os modelos de liderança. O que se espera hoje dos RHs e das lideranças é a criação de um ecossistema organizacional onde a confiança substitui o controle, e o bem-estar se torna tão importante quanto os resultados.
Trabalhar mais horas não é sinônimo de produtividade. As organizações de alta performance já compreenderam que os melhores resultados vêm de equipes emocionalmente saudáveis, com objetivos claros, comunicação transparente e espaço para a criatividade. A saúde mental deixou de ser um benefício adicional — tornou-se condição básica para o desempenho sustentável.
A nova geração já está aqui
As novas gerações — especialmente os jovens que hoje ingressam no mercado com um olhar mais sistêmico e questionador — não aceitam mais ambientes rígidos e hierárquicos. Eles querem voz ativa, querem contribuir com ideias, querem empreender mesmo dentro das empresas. E se não encontram esse espaço, não hesitam em buscar outros caminhos, inclusive criando seus próprios negócios.
Esses jovens já compreenderam algo fundamental: empresas saudáveis nascem de culturas organizacionais flexíveis, inclusivas e voltadas para o florescimento humano. São essas empresas que prosperarão em um cenário de mudanças aceleradas.
Da retenção à atração natural
Falar em “reter talentos” é olhar para o retrovisor. A nova fronteira do RH é criar ambientes tão inspiradores e autênticos que os talentos decidam, por vontade própria, contribuir e permanecer. E isso só será possível com uma gestão que valorize o ser humano em sua integralidade — corpo, mente e alma.
Em vez de se perguntarem “como reter?”, as organizações do futuro se perguntarão: “como podemos ser um espaço onde as pessoas queiram estar e crescer?” Porque é nesse espaço, onde liberdade e propósito coexistem, que o verdadeiro capital humano floresce — e com ele, a prosperidade genuína das empresas. ■
Sônia Crisostomo
Empresária, escritora, Coach em Well-being & Happiness, e ajuda pessoas de todas as partes do mundo a transformarem suas vidas para melhor
