
O Tribunal de Paris decretou seis meses de prisão com pena suspensa e uma multa de cinco mil euros para o vereador português da Câmara de Paris Hermano Sanches Ruivo, por conflito de interesses e abuso de confiança.
“Este é um processo baseado numa denúncia por tráfico de influências que estava vazia. Desde o início, afastámos a acusação de branqueamento de fraude fiscal”, disse à Lusa a advogada de Hermano Sanches Ruivo, Hèlene Lecat, referindo que durante a audiência o Ministério Público tinha abandonado “os factos de abuso de confiança” e “não há qualquer intencionalidade” na infração de tomada ilícita de interesses, que “é, de facto, um crime formal”.
Hermano Sanches Ruivo, de 59 anos, que deixou o cargo de adjunto responsável pelos Assuntos Europeus na Câmara Municipal de Paris há cerca de quatro anos, foi julgado no dia 26 de junho no tribunal de Paris pelos crimes de conflito de interesses e abuso de confiança, com a sentença pronunciada hoje.
O tribunal declarou ainda três anos de inelegibilidade e o pagamento de 1.500 euros para a Câmara Municipal de Paris, indo além do pedido do Ministério Público que pedia a absolvição no que toca à acusação de abuso de confiança, uma pena de três meses de prisão com pena suspensa pelo crime de conflito de interesses.
“Estou muito chocada que o tribunal tenha ido além do pedido do Ministério Público, que tenha querido absolutamente também fazer com que o funcionário português pagasse, até decretando a inelegibilidade. É uma decisão tomada em prejuízo do princípio da dúvida e da presunção de inocência”, referiu Lecat, à saída da sala de audiências.
Segundo o jornal francês Le Parisien, a Câmara Municipal de Paris, da socialista Anne Hidalgo, solicitou um euro simbólico como indemnização pelos danos causados.
Segundo a advogada, a imagem pública de Hermano Sanches Ruivo “foi muito afetada” porque “não participou em nenhuma deliberação”, mas mesmo assim foi condenado com “a maioria dos factos prescritos”.
O português, que ocupa funções como eleito no 14.º bairro de Paris, foi cofundador em 1991 e presidente da associação de lusodescendentes em França Cap Magellan, antes de passar a trabalhar como consultor remunerado da mesma.
Contactado pela Lusa, Hermano Sanches Ruivo afirmou que pretende recorrer da decisão do Tribunal, que considera “profundamente injusta” e que “não se compreende”.
“Fico atónito, inclusive sobre as motivações, embora nesta hora não tenhamos a leitura total que explica as decisões, mas como é que pode haver abuso de confiança, ao passo que a própria estrutura (Cap Magellan) não apresentou qualquer queixa, e isso ficou provado na audiência, que eu não estava a presidir à associação durante esses anos”, acrescentou.
Em 2021, após uma denúncia anónima por remunerações não declaradas, em que o autarca foi acusado de ter participado em deliberações da autarquia que atribuíram subsídios à Cap Magellan, recebendo posteriormente salários da própria associação pelas suas funções como consultor, a Câmara optou por contactar a comissão de ética da autarquia, dando assim início ao processo judicial.
Hermano Sanches Ruivo nasceu em Alcains, Castelo Branco, tendo ido muito jovem para França, sendo vereador na Câmara de Paris desde 2008, eleito por três mandatos consecutivos. Demitiu-se em dezembro de 2021 do cargo de adjunto da presidente da autarquia para os Assuntos Europeus após o conselho de deontologia da autarquia ter detetado “conflito de interesses”.
De acordo com o político, a decisão “parece estar ligada” ao “facto de ser acusado de ter participado em três votos de deliberação (mandatos)”, fazendo parte da equipa de Anne Hidalgo, tendo negado qualquer benefício.
“A lei está suficientemente incompleta, no sentido que o simples facto de ter participado, de ter tido a possibilidade de alguma forma apoiar, faz com que eu fique hoje julgado por causa disso”, disse, referindo que não pode aceitar uma decisão que é “injusta”, “quando não houve abuso de confiança e ninguém apresentou queixa por abuso de confiança.
O vereador de Paris, que permanecerá no cargo até março de 2026, afirmou ainda que não teve “o apoio que deveria ter tido” perante “uma denúncia que veio da comunidade portuguesa”, mas garante que “nem o trabalho nem a luta acabaram”, sendo ainda presidente da associação Ativa – Grupo de amizade França Portugal das Cidades e Autarquias Locais. ■
Agência Incomparáveis, com Lusa