
O Governo do Estado do Rio de Janeiro, Brasil, lançou, no último dia 7 de outubro, um painel público com informações sobre os casos de intoxicação por metanol no Estado. A iniciativa, desenvolvida pela Secretaria de Estado de Saúde (SES-RJ) do Rio, permite acompanhar em tempo real as notificações suspeitas, confirmadas e descartadas, com dados disponíveis no portal “Monitora RJ”. O objetivo é “reforçar a transparência e auxiliar as ações de Saúde e Segurança Pública no combate à venda e produção de bebidas adulteradas”.
Segundo o governo fluminense, o Estado mantém, desde o início de outubro, uma estrutura especial de resposta ao problema, com foco na prevenção e tratamento. Na segunda-feira, 6 de outubro, a SES-RJ recebeu do Ministério da Saúde do Brasil a primeira remessa de etanol farmacêutico e iniciou a compra do antídoto fomepizol, para garantir o tratamento rápido em casos de intoxicação.
O governador do Rio, Cláudio Castro, sublinhou que as medidas têm prioridade máxima e que o Estado está “em alerta e a atuar de forma integrada entre Saúde, Defesa do Consumidor e Polícia Civil, dando apoio aos municípios e trabalhando de forma preventiva”.
“tomar medidas para assegurar o acesso à saúde a cada paciente”
A Secretaria de Saúde criou uma Sala de Situação específica para monitorizar e definir estratégias de atuação, em articulação com o Ministério da Saúde do país. Até ao momento, há um caso em investigação no município de São Pedro da Aldeia e outro, em Niterói, já foi descartado.
“A Secretaria seguirá a monitorizar as possíveis suspeitas em todo o Estado e a tomar medidas para assegurar o acesso à saúde a cada paciente”, afirmou a secretária de Estado de Saúde do Rio, Claudia Mello, lembrando que sintomas como visão turva, desconforto gástrico e dores de cabeça após o consumo de álcool exigem procura imediata por atendimento médico. O Hospital Estadual Anchieta foi designado referência para tratamento de pacientes intoxicados.
No fim de semana anterior, no sábado, 4 de outubro, uma operação da Polícia Civil prendeu um suspeito e conduziu outras oito pessoas à delegacia por venda de bebidas fora da validade. Foram cumpridos 21 mandados de busca e apreensão na capital e na Baixada Fluminense, com apreensão de diversas garrafas suspeitas de falsificação. As amostras foram enviadas para análise laboratorial. A ação foi coordenada pela Delegacia de Repressão aos Crimes Contra a Propriedade Imaterial (DRCPIM) e integrou a força-tarefa criada pelo governo estadual, envolvendo as áreas de Saúde e Defesa do Consumidor.
Desde o início da semana, mais de 30 estabelecimentos foram vistoriados, incluindo bares, distribuidoras e casas noturnas, onde foram encontradas bebidas fora da validade, armazenadas incorretamente e com indícios de falsificação. O Instituto Estadual São Sebastião, na Gamboa, foi definido como unidade de referência para atendimento, enquanto o Laboratório Central de Saúde Pública Noel Nutels (Lacen-RJ) realiza as análises biológicas, em parceria com a Unicamp e o Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS/Fiocruz).
“É essencial que as equipas de saúde reconheçam rapidamente os sintomas da intoxicação para garantir atendimento imediato e eficaz”, destacou a secretária Claudia Mello.
Em complemento às ações repressivas, o Governo do Rio lançou uma cartilha educativa para orientar os consumidores sobre como identificar bebidas falsificadas. O material, elaborado pela Secretaria de Estado de Defesa do Consumidor (SEDCON) em parceria com o Procon-RJ e a Associação Brasileira de Bebidas (ABRABE), alerta para sinais de adulteração como preços muito baixos, erros de grafia nos rótulos, ausência de selo fiscal e lacres violados. O documento será disponibilizado nos sites institucionais e distribuído em terminais de transporte e locais de grande circulação.
“Estamos a unir inteligência, fiscalização e conscientização. O combate à falsificação de bebidas é uma pauta de saúde pública e de defesa do consumidor”, declarou o secretário de Defesa do Consumidor, Gutemberg Fonseca.
Durante o lançamento da cartilha, foi ainda firmado um protocolo de intenções entre o Governo do Estado e a ABRABE, criando a “Agenda Antipirataria de Bebidas do Estado do Rio de Janeiro”, considerada a primeira iniciativa deste tipo no país. O acordo prevê ações conjuntas de capacitação de fiscais e intensificação do combate à pirataria e adulteração de bebidas.
Apoio português
Portugal enviou, dia 7 de outubro, ampolas de Fomepizole injetável ao Brasil para apoiar o tratamento de vítimas da intoxicação por metanol registada em várias regiões do país. A operação envolveu o Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal, o Ministério da Saúde do Brasil, a Secretaria-Geral do Ministério da Saúde, o INFARMED e o Instituto Camões, em resposta a um pedido formal da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) do país sul-americano.
O antídoto, essencial no tratamento de intoxicações exógenas, foi doado como gesto de solidariedade no âmbito da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), com o objetivo de reduzir o número de mortes e auxiliar o sistema de saúde brasileiro na resposta à emergência pública.
Especialista defende maior atenção
A intensificação das ações no Rio ocorre em paralelo ao debate nacional sobre a origem das intoxicações por metanol registadas em diferentes Estados desde agosto. O especialista português João Carlos Farrapa, sommelier e apresentador do programa “Uvas e Personalidades”, questiona se o surto decorre de erro no processo de produção, contaminação acidental ou de prática criminosa.
“O problema pode ter origem na utilização indevida da substância durante a lavagem de vasilhames ou no reaproveitamento de garrafas descartadas, criando oportunidade para falsificadores”, escreveu este responsável, que também alertou para a dificuldade de o consumidor diferenciar sintomas de intoxicação de uma simples ressaca.
Farrapa destacou ainda que “não existe uma bebida totalmente segura”, embora cervejas e vinhos apresentem risco menor de contaminação.
A atuação coordenada entre as forças de segurança, saúde e defesa do consumidor no Brasil, aliada às medidas de transparência e educação pública, está a intensificar o combate à adulteração de bebidas e à intoxicação por metanol passou a ser tratado como prioridade de saúde pública no Brasil.
Segundo dados do Ministério da Saúde do Brasil, o país contabiliza 217 notificações de intoxicação por metanol, sendo 17 confirmadas e 200 em investigação. O Estado de São Paulo concentra a maioria dos casos, com 15 confirmações e 164 em análise, além de três mortes já confirmadas. A mais recente, uma mulher de 30 anos, em São Bernardo do Campo.
As autoridades brasileiras apuram a origem da contaminação, que pode estar ligada ao desvio de metanol importado pelo crime organizado para adulterar combustíveis, após a Operação Carbono Oculto desmantelar, em agosto, um esquema de fraude e lavagem de dinheiro no setor. O Ministério da Saúde criou uma Sala de Situação e coordena ações conjuntas com o Ministério da Justiça e com entidades do setor de bebidas para combater a falsificação e reforçar o controlo sanitário, num esforço nacional para conter o avanço dos casos e evitar novas vítimas.
“O Brasil enfrenta uma crise de saúde pública provocada pela intoxicação por metanol, presente em bebidas alcoólicas adulteradas vendidas ilegalmente em diferentes estados. Desde o final de agosto, dezenas de pessoas foram hospitalizadas e várias morreram após consumir bebidas contaminadas, sobretudo em São Paulo e no Paraná. Os sintomas incluem náuseas, tontura, visão turva e, nos casos mais graves, cegueira e morte”, comentaram fontes contactadas pela nossa reportagem. ■