Fliporto: para celebrar duas décadas de existência, evento literário brasileiro chega a Portugal

Fliporto celebra 20 anos e chega à Europa em parceria com a Fundação Livraria Lello, afirmando-se como “ponte cultural entre o Brasil e o mundo lusófono”

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Antônio Campos, advogado, escritor, Membro da Academia Pernambucana de Letras, ex-Presidente da Fundação Joaquim Nabuco, Membro da ABI – Associação Brasileira de Imprensa e presidente do Instituto Fliporto. Foto: divulgação
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A Festa Literária Internacional de Pernambuco (Fliporto) chega a 2025 com uma marca histórica: duas décadas de existência a promover a literatura como instrumento de transformação social e diálogo cultural. Criada por António Campos, escritor e presidente do Instituto Fliporto, o evento consolidou-se como o “mais importante festival literário do Nordeste brasileiro” e um dos mais relevantes do país, reunindo escritores, leitores, académicos e artistas em torno do livro, da arte e da palavra. Nesta edição comemorativa, Recife recebe uma programação estruturada em sete eixos culturais — da juventude à cultura pop — refletindo o caráter plural e contemporâneo da Fliporto, que desde 2005 vem renovando a relação entre literatura, tecnologia e cidadania.

Com os 20 anos a servir de marco simbólico, o festival ultrapassa pela primeira vez as fronteiras brasileiras e atravessa o Atlântico para instalar-se em Portugal, no Mosteiro de Leça do Balio, em Matosinhos, Norte do país, numa parceria com a Fundação Livraria Lello, entre os dias 22 a 25 de outubro. A estreia europeia representa um “passo decisivo” na internacionalização do evento e reforça o papel da Fliporto como “ponte entre as culturas lusófonas”.

Em entrevista exclusiva, António Campos fala sobre o percurso do festival, os desafios de manter viva a literatura num mundo digital e o significado desta expansão que celebra a língua portuguesa como casa comum.

A Fliporto celebra 20 anos em 2025. Que balanço faz destas duas décadas de trabalho e como define o impacto da Festa Literária Internacional de Pernambuco na cena cultural brasileira?

A Fliporto nasceu, em 2005, com o propósito de celebrar a literatura e o livro como instrumentos de transformação social. Vinte anos depois, posso dizer que o festival se consolidou como o maior evento literário do Nordeste e um dos mais influentes do Brasil. Foram duas décadas de escuta e partilha com autores, leitores, professores e jovens de diferentes origens. A Fliporto tornou-se um verdadeiro ecossistema cultural, plural por vocação, onde a literatura dialoga com a arte, a tecnologia e a cidadania. O impacto é visível tanto na formação de novos leitores como na valorização das vozes periféricas e da juventude, que hoje têm espaço próprio na programação.

A edição de 2025, no Recife, apresenta sete eixos culturais, entre eles tecnologia, juventude e cultura pop. Como essa diversidade reflete a essência da Fliporto?

A diversidade é a alma da Fliporto. Desde as primeiras edições, sempre acreditámos que a literatura precisa de conversar com o seu tempo. Os sete eixos de 2025, que incluem a Fliporto Arte, a Fliporto Geek, a Fliporto Cordel, o Espaço UBE e a Arena Jovem, mostram como a cultura se reinventa e como o livro continua vivo, mesmo em tempos digitais. Queremos falar para as novas gerações, aproximar o público da leitura e, sobretudo, mostrar que a literatura não é uma ilha: é o centro de um arquipélago onde cabem todas as expressões culturais.

Pela primeira vez, a Fliporto atravessa o Atlântico e chega a Portugal. O que representa esta estreia europeia para si e para a história do festival?

Levar a Fliporto a Portugal é um sonho antigo que agora se concretiza de forma natural, no ano em que celebramos 20 anos. É um gesto simbólico e afetivo: Portugal foi o berço da nossa língua e é também um território de encontro entre tradição e modernidade. A parceria com a Fundação Livraria Lello, um ícone mundial do livro, dá-nos uma base sólida para expandir esse diálogo lusófono e somos gratos a acolhida da Fundação Livraria Lello. Esta edição portuguesa é um passo decisivo na internacionalização do festival e uma homenagem à língua que nos une. Queremos que o público europeu sinta o espírito vibrante e humanista que sempre caracterizou a Fliporto no Brasil.

O Mosteiro de Leça do Balio será palco da Fliporto Portugal. Como surgiu essa parceria com a Fundação Livraria Lello e o que o motivou a escolher Matosinhos como destino de estreia?

A Fundação Livraria Lello tem uma missão que se alinha perfeitamente com a da Fliporto: promover a literatura, a cultura e o pensamento crítico. Quando conversámos com a presidente Rita Marques, percebemos imediatamente que havia uma sintonia de valores. O Mosteiro de Leça do Balio, além da sua beleza e valor patrimonial, representa um espaço de memória e de futuro. É o cenário ideal para acolher a Fliporto Portugal, que procura justamente unir o passado e o amanhã da língua portuguesa. Matosinhos, com a sua energia cultural e ligação ao Porto, é um território fértil para esse diálogo.

A programação em Portugal destaca-se pela entrega dos Prémios Literários Guerra Junqueiro a Dulce Maria Cardoso e Amélia Dalomba. Que importância atribui a essa valorização da lusofonia e das autoras premiadas?

A entrega desses prémios é um dos momentos mais simbólicos da Fliporto Portugal. Dulce Maria Cardoso e Amélia Dalomba representam duas vozes fundamentais da literatura contemporânea em língua portuguesa, uma de Portugal, outra de Angola. A celebração das suas obras é também um tributo à diversidade do nosso idioma. A Fliporto sempre defendeu que a lusofonia é um território cultural sem fronteiras. Valorizar essas autoras é afirmar que a literatura lusófona é viva, múltipla e essencial para o entendimento entre povos que partilham uma mesma língua.

A sua trajetória pessoal e profissional está profundamente ligada ao universo dos livros. Como o escritor e o produtor cultural António Campos se entrelaçam na construção da Fliporto?

Costumo dizer que sou “filho de escritor e nasci entre livros”. Essa herança do meu pai, o escritor Maximiano Campos, moldou a minha relação com a palavra. Como autor de 17 livros publicados e 15 inéditos, aprendi que a literatura é tanto introspeção como partilha. A Fliporto nasceu desse impulso: o desejo de criar um espaço onde o leitor se encontre com o autor, e ambos com a sociedade. A minha experiência como advogado e gestor cultural também contribuiu, porque a Fliporto exige tanto sensibilidade artística como capacidade de organização e diálogo institucional. É uma síntese da minha vida: o direito, a política e a literatura convergem num projeto coletivo de cultura.

Depois desta estreia europeia, que caminhos imagina para o futuro da Fliporto? Há planos para novas edições fora do Brasil?

Sim, a ideia é dar continuidade a esse movimento. Portugal é o primeiro passo, mas queremos que a Fliporto torne-se um festival itinerante dentro do universo lusófono. Sonhamos com edições em Angola, nos Açores, em Cabo Verde e em Moçambique, além de regressar a Portugal com regularidade. Acreditamos que a língua portuguesa é uma casa comum, e a Fliporto pode ser uma das suas salas mais vivas. O futuro será de cooperação e de continuidade, sempre unindo instituições, leitores e criadores numa grande rede de cultura, memória e inovação. ■

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