A mesa “Política literária”, mediada por Ricardo Prado, aconteceu no fim de sexta-feira, 3 de novembro, no palco CDA, com a fala da editora Rejane Dias, do Grupo Autêntica. Itabirana, ela declarou a dupla alegria em estar em sua terra, cercada por familiares e amigos, além da satisfação de falar sobre livros.
Reconhecida no mercado editorial brasileiro, Rejane Dias abriu a discussão ressaltando que editores são, comumente, vistos como reclamações por enfrentar um mercado instável. “Existem muitos fatores que transformaram nosso negócios nos últimos anos, como a derrocada das duas principais redes de livrarias do país, com mais de 120 lojas, por serem os maiores vendedores de livros no Brasil”, reforçou.
Usando números e dados reais do mercado físico e digital de vendas de livros, a editora explicou como as livrarias vem perdendo força ao longo dos últimos anos. Também expôs a dura realidade, dos últimos quatro anos, para a baixa compra de obras literárias por parte das gestões públicas municipais, estaduais e federal, em todo o país. Por fim, citou os perigos das gerações mais jovens, intensamente expostas às telas e ambientes virtuais.
Rejane Dias citou “A fábrica de cretinos digitais”, lançada por sua editora. “Os dados fornecidos neste livro são assustadores. Por isso, a discussão sobre políticas literárias é importante para formar jovens leitores. E os adultos? Nós todos estamos com o foco roubado”, comentou.
Na sequência, Simone Paulino, da editora NÓS, foi convidada a falar sobre o crescimento da empresa e os prêmios recebidos por ela. “A minha história com o mercado é completamente diferente, eu não sofri nenhum impacto direto da quebra das livrarias citadas pela Rejane porque elas não queriam saber dos meu livros. As obras de literatura brasileira contemporânea, de uma editora independente, não interessavam a eles. Tinha um movimento comercial muito predatório”, relembrou.
Simone Paulino também trouxe à tona que não contava com espaço de exposição e começou a fazer o trabalho de formiguinha de convencer os leitores, um por um. “Ainda assim, no ano passado, “Guardamos pedras aqui”, de Luiza Romão, feito de forma completamente amorosa, ganhou dois prêmios Jabuti e, até 2024, vai ser traduzido para oito países. Isso é o resultado de um modo de fazer específico”.
Rejane e Simone aproveitaram o momento para falar um pouco sobre o assédio de editoras que, diferente delas, não apostam em autores estreantes e que esperam as empresas independentes chegarem a um bom nível de venda para procurá-los. “Acho isso uma injustiça brutal. As grandes editoras acabam levando o pilar comercial das pequenas. O que tem aí é o capital ditando as regras”, confessou Simone Paulino.
Para a participação de Rodrigo Lacerda, Ricardo Prado elogiou a capacidade do escritor de se dividir entre as funções de ser autor e editor. Ele contou que, ainda muito novo, ele se dedicou à carreira como editor trabalhando em diferentes empresas ao longo dos anos. “Para citar uma frase do Alfredo Machado, fundador da Editora Record, ‘ser editor no Brasil é como andar numa montanha-russa: você fecha os olhos, joga os braços para trás e grita’. E é isso mesmo, porque tudo é muito instável. O maior problema editorial que eu considero é o fato de que ou você é grande, ou você é mínimo. O estágio intermediário no mundo editorial nacional é difícil. Acho isso uma pena”, lamentou. Sobre seu trabalho como escritor, Lacerda declarou que “a contribuição que damos além dos nossos livros, é o esforço de atrair o público para o mundo da literatura”.
Ricardo Prado concluiu questionando aos editores o que mais pode ser feito para atrair os leitores. Para Rejane Dias, “o primeiro caminho é em casa. Nós, de modo geral, vemos pouco os pais levando as crianças nas livrarias. Além disso, eventos em que a gente coloca as crianças em uma programação intensa em festivais e bienais de literatura são indispensáveis”.
Simone Paulino finalizou refletindo sobre o grande mistério que é a descoberta do livro e da literatura. “Meus pais eram analfabetos. Não tinha livros na minha casa. Meu primeiro exemplar, eu ganhei do meu primeiro editor quando me formei em jornalismo. No entanto, eu me tornei uma grande leitora. E tenho muito orgulho disso. Foi a educação que me permitiu isso. Quando a professora escreve no seu caderno ‘excelente, continue assim’, ela te dá uma palavra de afirmação, escrita, que ninguém te deu, para você fundar um mundo”.
Criado pelo jornalista Afonso Borges – que é também o idealizador do Festival Literário de Araxá (Fliaraxá) e do Sempre um Papo –, o Flitabira realizará sua terceira edição entre os dias 31 outubro e 5 de novembro de 2023, celebrando 121 anos de nascimento do poeta Carlos Drummond de Andrade. As atividades acontecem tanto de forma presencial, na Praça do Centenário, quanto on-line, pelo canal no YouTube do Festival.
O Flitabira tem patrocínio do Instituto Cultural Vale, via Lei de Incentivo à Cultura, a Lei Rouanet, do Ministério da Cultura, com o apoio da Prefeitura de Itabira e União Brasileira de Escritores – UBE. ■