
Hoje, 22 de abril, celebramos oficialmente o “Descobrimento do Brasil” — expressão que por si só já comporta debates históricos — e o Dia da Comunidade Luso-Brasileira. Contudo, o que deveria ser uma ocasião de profunda reflexão e celebração compartilhada entre povos historicamente entrelaçados passa, ano após ano, praticamente despercebida pelo grande público, pelas instituições e, o mais preocupante, pelo sistema educacional brasileiro.
Em tempos em que o mundo redescobre a importância das origens, da identidade e da pluralidade cultural, é quase paradoxal o silêncio que envolve esta data, justamente no país que, segundo estudos recentes publicados na revista científica American Journal of Human Biology, carrega em seu genótipo uma média de 80% de ancestralidade europeia — sendo cerca de 40% dessa influência atribuída diretamente à matriz portuguesa. Isso significa que algo próximo de 100 milhões de brasileiros possuem herança genética lusitana. Uma estatística que deveria ser celebrada, compreendida e valorizada.
Mas não é.
A Comunidade Luso-Brasileira não é apenas um elo simbólico entre o Brasil e Portugal. Ela é uma realidade viva, em constante expansão. Cresce a cada dia com o novo êxodo migratório de brasileiros para Portugal; com a concessão de nacionalidade portuguesa a descendentes; com a crescente massa de emigrantes que ali estabelecem família, criam raízes e contribuem para a economia, cultura e diversidade portuguesa. Portugal, por sua vez, passa a se moldar também à alma brasileira, num fenómeno de fusão que se repete ciclicamente ao longo de mais de 500 anos.
Ainda assim, essa comunidade continua a ser “invisibilizada” em termos institucionais. Carece de representação política efetiva, de políticas públicas integradas e de reconhecimento proporcional à sua dimensão histórica, cultural e económica. O sistema de ensino, por exemplo, ignora solenemente a importância da data de 22 de abril. As escolas raramente promovem discussões críticas e construtivas sobre o papel da cultura portuguesa na formação do Brasil, muito menos estimulam um sentimento de pertencimento e de herança comum.
Como podemos esperar que a Comunidade Luso-Brasileira se sinta parte ativa da história, se o próprio Estado falha em lhe oferecer um espaço digno de memória e valorização?
Na Federação das Câmaras Portuguesas de Comércio no Brasil temos procurado reverter essa lógica. Acreditamos que o fortalecimento dos laços luso-brasileiros não deve ser apenas retórico, mas efetivo, ancorado em políticas de integração, de reconhecimento e de intercâmbio permanente — comercial, educacional, cultural e social.
Hoje, portanto, não devemos apenas lembrar o passado. Devemos projetar o futuro. E este futuro exige que reconheçamos o tamanho, a importância e o potencial da Comunidade Luso-Brasileira. Que deixemos de tratar o 22 de abril como uma nota de rodapé e passemos a honrá-lo como capítulo central da nossa identidade compartilhada.
Porque, no fundo, não se trata apenas de uma data. Trata-se de reconhecer quem somos. E de onde viemos. Para então, juntos, sabermos aonde podemos chegar. ■
Carlos Alberto Lopes
Presidente da Federação das Câmaras Portuguesas de Comércio no Brasil
Parabéns pela matéria!!