O Salão Nobre do Palácio da Independência, em Lisboa, recebeu no último dia 13 de outubro um encontro promovido pelo Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP) e pela Sociedade Histórica da Independência de Portugal (SHIP), dedicado ao tema “(Re)Conhecer e Valorizar as Comunidades Portuguesas no Estrangeiro”. A iniciativa reuniu conselheiros, dirigentes, investigadores, representantes da diáspora portuguesa e o secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, num debate sobre a importância estratégica da diáspora no contexto nacional e internacional.
A sessão de abertura contou com as intervenções de José Ribeiro e Castro, presidente da SHIP, de Flávio Martins, presidente do Conselho Permanente do CCP, e de Emídio Sousa, secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.
Durante a sessão de abertura, Flávio Martins afirmou que “o trabalho a realizar pelas comunidades portuguesas continua a ser vasto e essencial”.
“Estamos aqui para discutir não apenas a importância histórica das comunidades portuguesas, mas também o que elas representam hoje enquanto ativo estratégico para Portugal”, acrescentou o presidente do Conselho Permanente, que defende que “as comunidades portuguesas não se limitam a um território nacional”, mas “estendem-se por quase duas centenas de países e constituem uma parte essencial da nossa portugalidade”.
“O Conselho das Comunidades Portuguesas é um órgão legitimado democraticamente, composto por representantes eleitos das suas próprias comunidades”, recordou Flávio Martins, explicando que o encontro teve como propósito “ouvir os parceiros e as várias vozes que ajudam a compreender a realidade migratória portuguesa”.
Por sua vez, Emídio Sousa avançou que está a trabalhar para “transformar o conceito tradicional de nação”.
“Quero construir uma verdadeira “nação global de portugueses. (…) Pretendo criar uma nova visão, que chamo de “Portugal Nação Global”, explicou Emídio Sousa, que pretende juntar todos os portugueses do mundo, além de empresários, autarcas, entidades e representantes das comunidades, para “promover negócios, parcerias e desenvolvimento económico”.
O anfitrião do evento, José Ribeiro e Castro, comentou que “os emigrantes são, talvez, a maior escola de patriotismo que existe em Portugal”.
“Quem está longe sente, muitas vezes, as raízes de forma mais intensa do que quem vive cá, e isso é um alimento essencial para a vida cultural e para a afirmação cívica das comunidades portuguesas nos países onde estão. O português que vive fora, mesmo que seja apenas um, é sempre alguém que leva consigo a bandeira, a identidade e o orgulho de ser português”, acrescentou este responsável, destacando o papel de quem, “em qualquer canto do mundo, mantém viva a presença de Portugal”.
José Ribeiro e Castro lembrou ainda que o “Palácio da Independência tem uma ligação profunda à comunidade portuguesa do Brasil”.
“Se saírem e olharem para a parede, verão uma placa que assinala que a colónia portuguesa no Brasil doou este espaço ao Estado português, em 1940. Foi um gesto simbólico e generoso dos portugueses do Brasil, que adquiriram o edifício e o colocaram à disposição de três entidades, entre as quais a Sociedade Histórica”, referiu.
Temas preocupam as comunidades
Após essas três intervenções, seguiu-se um painel moderado pela jornalista Paula Machado, da RDP Internacional, sob o tema “Comunidades como as percebemos e o que fazer: um ativo, uma mais-valia ou uma peça de retórica?”.
Entre os oradores estiveram Manuela Aguiar, antiga secretária de Estado das Comunidades Portuguesas, António Calçada de Sá, presidente do Conselho da Diáspora junto da Presidência da República, Álvaro Beleza, presidente da Associação para o Desenvolvimento Económico e Social (SEDES), Paulo Costa, presidente da Associação “Também Somos Portugueses”, Cláudia Pereira, investigadora do Observatório da Emigração, Maria de Lurdes Almeida, antiga conselheira do CCP na Venezuela, e os atuais conselheiros Rui Marcelo, de Macau, e Vasco Abreu, da África do Sul.
As preocupações dos oradores foram lineares, tendo como pano de fundo a representação das comunidades portuguesas, a lei eleitoral e a ausência do projeto piloto para o voto eletrónico.
“Há cerca de nove anos que andamos com a história e com a falácia do teste eletrónico. Não queremos o voto eletrónico agora, mas, sim, um teste. (…) Vai haver eleições para o CCP em dois anos. Espero que, quando houver, façam o teste”, disse Rui Marcelo, que anunciou uma nova feramente digital para breve que, desde Macau, possibilitará aproximar os jovens. Este responsável sugeriu ainda que Portugal pode aproveitar Macau, e a China, como plataformas económicas de internacionalização para Portugal, tendo o apoio da diáspora.
Por sua vez, Maria de Lurdes Almeida sublinhou que as comunidades portuguesas são “uma mais valia com potencial económico, cultural e social”, pois “defendemos tudo o que é português lá fora”. Esta antiga conselheira reforçou ainda a ideia de que devem haver ações concretas, para que a diáspora não seja vista como uma peça de “retórica”.
Álvaro Beleza foi mais longe e considerou que os governantes não querem apostar no voto eletrónico, porque as comunidades portuguesas somam um milhão de pessoas e esse número de votos pode decidir as legislativas.
Por seu turno, António Calçada de Sá destacou as relações conjuntas com o CCP num formato que possibilita um maior diálogo entre as duas entidades em prol das comunidades portuguesas.
Paulo Costa enumerou os temas discutidos com a equipa do Instituto dos Registos e do Notariado (IRN) relativamente ao tratamento documental e serviços junto das comunidades, além de referir a importância do voto eletrónico, um argumento que faz parte também das preocupações de Vasco Abreu, conselheiro na África do Sul.
“O voto eletrónico é um instrumento para a igualdade de direito, mas notei que é absolutamente incomodante”, realçou Manuela Aguiar, antiga secretária de Estado das Comunidades Portuguesas, que não esconde que, hoje, os portugueses emigrados “não têm voz”, prova disso são apenas os quatro deputados eleitos pela emigração, que “não são ouvidos por ninguém”.
O encontro encerrou com uma reflexão conjunta sobre a necessidade de reforçar a articulação entre o Estado português e as comunidades no estrangeiro, reconhecendo o seu papel como parte essencial da projeção internacional de Portugal.
Recorde-se que o Conselho Permanente do Conselho das Comunidades Portuguesas está reunido na capital portuguesa entre os dias 14 e 16 de outubro, com uma agenda que inclui encontros com os principais grupos parlamentares, responsáveis governamentais e candidatos à Presidência da República portuguesa.
A reunião decorre na Assembleia da República, tendo como temas centrais o Orçamento do Estado de 2026 no âmbito das Comunidades Portuguesas, as alterações à legislação eleitoral e às modalidades de voto, a expansão da rede de ensino português no estrangeiro (EPE), a gestão de pessoal e o atendimento nos postos consulares, o reforço da plataforma e-Consulado, os fluxos migratórios e a dimensão empresarial das comunidades, o funcionamento dos gabinetes de apoio e o Programa Voltar. Também será debatida a proposta de aumento do número de deputados eleitos pelas comunidades portuguesas. ■