Scholastique Mukasonga e Itamar Vieira Junior partilharam experiências de vida e de escrita em Araxá

"Dor transformada em palavra" marca encontro dos homenageados no 13.º Fliaraxá

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Foto: divulgação
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O 13.º Festival Literário Internacional de Araxá (Fliaraxá) viveu um dos seus momentos mais marcantes com a presença conjunta dos dois homenageados desta edição, a escritora ruandesa Scholastique Mukasonga e o escritor brasileiro Itamar Vieira Junior. O encontro, mediado pelo curador Jeferson Tenório, encheu o palco do Teatro CBMM com reflexões sobre dor, memória e literatura.

A sessão abriu com a leitura, pelo ator Odilon Esteves, de um excerto do romance Baratas, de Mukasonga, que retrata pesadelos ligados ao genocídio do povo tutsi em Ruanda. A partir daí, Tenório lançou a questão central da conversa: como transformar em literatura experiências tão violentas e dolorosas.

Scholastique respondeu sublinhando a emoção de estar no Brasil e no Fliaraxá, onde disse sentir-se “adotada” pelo público. Referiu que nunca planeou transformar a dor em escrita, mas que o destino a levou a cumprir a missão de testemunhar, em livros, aquilo que em Ruanda era preservado pela oralidade.

“Um sobrevivente perde a palavra. Escrever foi a forma que encontrei de falar”, afirmou.

Itamar, por sua vez, destacou que a escrita lhe permite elaborar reflexões sobre as inquietações sociais e históricas do Brasil. Recordou a sua vivência como geógrafo em comunidades rurais e frisou que escrever sobre dor nunca é confortável, mas que o desconforto também é parte da recriação literária.

“A dor não nos engrandece, mas escrever sobre ela abre um espaço de reflexão sobre a realidade”, afirmou.

Ambos os homenageados enfatizaram a centralidade das mulheres nas suas narrativas. Mukasonga contou que a mãe e as mulheres ruandesas foram responsáveis pela transmissão de valores e tradições, e que essa memória está presente em toda a sua obra. Já Itamar destacou que devolve a voz literária às personagens femininas historicamente silenciadas, por considerar que só assim a história pode ser contada de outra perspetiva.

Na reta final, Mukasonga abordou ainda o processo de reconstrução de Ruanda após o genocídio, frisando que a resistência e a sobrevivência nasceram do próprio povo. “O mais importante é que a gente conte as coisas, não esconda nada”, referiu. Itamar, por sua vez, sublinhou que a literatura tem a capacidade de criar sensibilidade no leitor para o drama humano, ligando a sua experiência à da colega homenageada.

O 13.º Fliaraxá decorre até 5 de outubro, no Teatro CBMM do Centro Cultural Uniaraxá, em Minas Gerais. Além das mesas de conversa, o programa inclui lançamentos de livros, prémios de redação, atividades infantis e apresentações musicais. O festival é realizado pela CBMM, via Lei Rouanet do Ministério da Cultura, com apoio cultural da Bem Brasil, Centro Cultural Uniaraxá, TV Integração e Academia Araxaense de Letras. ■

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