Opinião: “Vozes Silenciadas: o Esquecimento Político dos Emigrantes Portugueses no Brasil”, por Carlos Lopes

“A omissão é particularmente grave para os emigrantes portugueses no Brasil, que viram desaparecer a única voz ativa que os representou nos últimos anos: o deputado Flávio Martins”

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Carlos Alberto Lopes, emigrante português no Brasil e dirigente associativo
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A recente nomeação do novo governo português liderado por Luís Montenegro deixou um amargo silêncio reverberando entre os milhões de portugueses espalhados pelo mundo — especialmente os da América Latina. Com a vitória do PSD nas últimas eleições legislativas e a eleição de José Cesário como deputado pelo círculo fora da Europa, tudo indicava que continuaria com a Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, mantendo alguém com experiência, legitimidade democrática e profundo conhecimento da diáspora. No entanto, mais uma vez, a esperança cedeu lugar à frustração.

A decisão de Montenegro de não nomear Cesário para a pasta das Comunidades — um dos quadros mais experientes e respeitados em matéria de emigração — equivale, politicamente, a um recuo civilizacional. A omissão é particularmente grave para os emigrantes portugueses no Brasil, que viram desaparecer a única voz ativa que os representou nos últimos anos: o deputado Flávio Martins.

Este episódio não é um fato isolado. Remete-nos diretamente ao que ocorreu durante o último governo do PS, quando António Costa optou por colocar Augusto Santos Silva na presidência da Assembleia da República. À época, a decisão custou caro à representação da diáspora: o então deputado Paulo Porto Fernandes, também oriundo do círculo fora da Europa, perdeu o seu espaço político. O padrão repete-se: os grandes partidos utilizam os votos dos emigrantes como moeda eleitoral, mas ignoram as suas vozes na hora da construção efetiva da política pública.

É um jogo cínico e injusto. Os emigrantes, particularmente os do Brasil, têm sido há séculos pilares fundamentais da economia portuguesa. Foram eles que, nas crises mais profundas da República, mantiveram o país de pé com as suas remessas. São eles que promovem, com orgulho e sem contrapartida, os produtos, a cultura e o turismo português em terras distantes. No entanto, continuam sendo tratados como apêndices políticos, usados, descartados e esquecidos.

É hora de dizer basta.

Convoco os emigrantes portugueses no Brasil — sejam eles de primeira, segunda ou terceira geração — a se unirem. Não apenas para lamentar, mas para agir. Exijamos dos partidos políticos portugueses seriedade, compromisso e lealdade. Reivindiquemos uma profunda reforma do sistema eleitoral, que passa obrigatoriamente pela revisão da forma de votação no estrangeiro (atualmente limitada, ineficiente e suscetível a erros) e pela criação de um círculo eleitoral exclusivo para o Brasil — país que abriga a maior comunidade portuguesa fora de Portugal.

Está na hora de transformar a indignação em ação política organizada. É necessário construir um movimento de representação forte, coeso, apartidário e permanente que dialogue com Lisboa de igual para igual. Os emigrantes já não podem ser vistos como meros enviados de divisas, mas como cidadãos plenos, com direitos e voz ativa no presente e no futuro da nação.

Portugal não pode continuar a virar as costas a quem nunca o abandonou. ■

Carlos Alberto Lopes

Emigrante português no Brasil e dirigente associativo11

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4 COMENTÁRIOS

  1. Matéria muito interessante e bem colocada.
    Todavia, “data venia” creio que existem alguns detalhes que devem ser apreciados caso a caso, e não de forma global.

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